O preço do ouro está em uma escalada de recordes histórica em meio às incertezas da tensão comercial. Tradicional porto seguro em momentos de turbulência global, o metal está cotado, atualmente, por volta de US$ 3,3 mil a onça. Instituições financeiras como o Goldman Sachs Group Inc. e o JP Morgan, entre outras, projetam uma alta para US$ 4 mil até meados de 2026. Trata-se de um aumento de 100%, se considerar o valor em torno de US$ 2 mil a onça em janeiro de 2024. O que pode acontecer é um momento de maior dificuldade de liquidez, segundo Gilberto Braga, economista e professor do MBA em finanças do Ibmec.
“É sempre bom lembrar que existe o ouro físico e o ouro em contratos, e quem compra ouro em barra tem sempre a questão da guarda, da custódia, e isso pode ser um custo adicional indesejável. Por isso muitos preferem comprar contratos em que você se desincumbe dessa necessidade”, diz Braga sobre os fundos de investimentos de ouro negociados em bolsa, os ETFs. Ele avalia que o metal continuará uma opção no futuro para investidores diluírem suas carteiras e riscos.
Otavio Costa, sócio da Crescat Capital, analisa que o ouro é a principal alternativa monetária fora do sistema fiduciário. “O movimento de acúmulo de ouro por bancos centrais, observado nos últimos anos, sugere o início de um novo ciclo estrutural de realocação estratégica de ativos por parte das autoridades monetárias”, afirma. O Banco Popular da China adicionou ouro a suas reservas por cinco vezes consecutivas em março.
Só em 2025, o metal já escalou 26% no gráfico de investimentos. São saltos que o mercado entende como bem ancorados em fundações tangíveis e reais. Uma prova é uma pesquisa entre gerenciadores de fundos globais feita pelo Bank of America. Na sondagem, 42% afirmam que o ouro terá a melhor performance na classe de ativos.
Com 370 toneladas anuais, a China é disparado o maior produtor de ouro no mundo, seguida por Rússia, Austrália, Canadá e Estados Unidos. O Brasil aparece em 14o lugar. “O país tem um potencial muito grande ainda a ser alcançado”, afirma Rodrigo Barbosa, CEO da Aura Minerals. Apenas 25% do território nacional possui dados geoquímicos, segundo dados do Serviço Geológico do Brasil (SGB). Isso significa que a pesquisa de ouro e outros minerais em áreas não mapeadas é mais complexa.
Com a criação da Agência Nacional de Mineração (ANM) e mecanismos de incentivo ao financiamento junto ao BNDES, os produtores avaliam que podem encontrar novas reservas de ouro. Ao mesmo tempo, players mundiais têm bons olhos para a produção brasileira. Barbosa lembra que a Aura vendeu o Projeto Serrote da Laje, em Alagoas, para o fundo britânico Appian Capital Advisory LLP, em 2018. Posteriormente, houve nova venda, para o grupo chinês Baiyin Nonferrous, por US$ 420 milhões.
A Aura mira depósitos já descobertos. Entre pesquisar e descobrir ouro, leva-se de seis a oito anos. Somando a engenharia e construção, mais três ou quatro, totalizando perto de uma década. “Nosso jogo não é descobrir novos depósitos, não temos esse know-how. Gostamos é de comprar os já descobertos, como o Borborema (RN), em 2022, em operação, e o Almas (TO), que desenvolvemos e colocamos capacidade de gestão, engenharia e balanço”, diz Barbosa.
Acúmulo de ouro por BCs sugere novo ciclo de realocação de ativos” — Otavio Costa
O preço do ouro em ascensão permite às mineradoras uma maior capitalização e condições de implementar mais investimentos. “Mesmo que o preço chegue a US$ 4 mil a onça, você não consegue subir a produção rapidamente. Por isso que o ouro vale tanto: é muito difícil encontrá-lo e produzi-lo. Leva-se décadas para o mundo encontrar novos depósitos e, significativamente, aumentar a produção do metal”, diz o CEO da Aura.
Outra mineradora com projetos grandiosos no Brasil é a britânico-peruana Hochschild Mining. A empresa comprou uma planta em Mara Rosa, Goiás, que no segundo trimestre de 2024 entrou em produção comercial e tem expectativa de tirar duas toneladas de ouro ao ano do local, em um investimento de R$ 1 bilhão. Nesse entusiasmo, ela também adquiriu o projeto de mineração Monte do Carmo, em Tocantins, onde pretende aportar R$ 1,4 bilhão na empreitada.
O ouro pode ser um investimento que alguns já acreditam em “fim de festa”, como descreve o estrategista de mercado global Sameer Samana, da Wells Fargo Investment Institute. Mas, ainda assim, diante da fraqueza do dólar, aumento de expectativas com inflação e volatilidade das bolsas quanto à guerra tarifária, é um investimento que oferece baixo risco em portfólios, como afirma ao Juan Carlos Artigas, global head of Rrsearch do World Gold Council.
“A liquidação de ouro que o tradicionalmente robusto Departamento do Tesouro dos Estados Unidos fez no mercado no início de abril elevou a confiança dos investidores. O grande fluxo positivo dos ETFs de ouro - que somaram este ano até o momento US$ 30 bilhões, com somente US$ 9 bilhões nas duas primeiras semanas de abril -, continuarão atraindo, e muito, acredito, os investidores para o metal”, afirma Artigas.