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Jornal Extra - Martha Imenes (17/09/2021)

Aumento do IOF vai pesar no bolso do consumidor; confira simulações

O aumento do imposto anunciado pelo governo vai encarecer ainda mais o crédito para pessoas físicas

Diante de um cenário de 62,2 milhões de brasileiros inadimplentes, segundo dados da Serasa, 14,4 milhões de desempregados, 11.890 mil famílias endividadas e perspectiva de inflação a 7,90% para este ano, o aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) anunciado pelo governo Bolsonaro vai encarecer ainda mais o crédito para pessoas físicas, que vai passar de 3% ao ano para 4,08% (a.a.) até dezembro. Ou seja, empréstimo consignado, despesas com cartão de crédito, cheque especial e financiamentos vão ficar mais caras. Vale lembrar que o aumento do imposto vai de 20 de setembro a 31 de dezembro deste ano. O governo pretende arrecadar R$ 2,14 bilhões adicionais para financiar o novo Bolsa Família.

Para o economista Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor-executivo da Associação Nacional de Executivos de Finanças (Anefac) o aumento do IOF foi uma "péssima" decisão porque agrava o cenário econômico já adverso e não resolve o problema do governo.

— É uma medida péssima porque encarece o crédito num momento em que o endividamento está muito elevado e os juros já subiram nos últimos sete meses. E vão subir de novo na próxima reunião do Copom e a projeções de crescimento do país só caem, já se fala em zero para o ano que vem — diz o economista, que acrescenta que: "Esse aumento só agrava esse quadro, porque crédito mais caro significa custo para as empresas, que vão repassar aos preços e aumentar ainda mais a inflação".

O economista Gilberto Braga, professor do Ibmec e da Fundação D. Cabral, explica que por se tratar de um imposto, o IOF é aplicado sobre a base de cálculo nas operações financeiras que são alcançadas pelo tributo.

— Tecnicamente, ele não aumenta diretamente o juros da transação financeira, mas sim o custo final da operação, uma vez que incide sobre a parcela ou dívida — conta o professor.

— Em termos práticos o IOF incide por cada dia contratado até 360 dias. Embora as alíquotas fixadas sejam anuais, elas são aplicadas proporcionalmente à quantidade de dias da operação. Assim, se pessoa usa o limite do cheque especial ou dívida no cartão de crédito por 20 dias, vai pagar proporcionalmente o IOF sobre 20 dias aplicado sobre o valor da operação — explica.

— A alteração do imposto aumenta o endividamento das pessoas e da empresas, ainda mais num momento de pandemia, onde é comum recorrer a dívidas sujeitas ao IOF no dia a dia. As empresas usam com frequência empréstimos para capital de giro e as famílias usam muito o cartão de crédito, cheque especial e fazem compras pela internet e em sites estrangeiros (o IOF incide no câmbio da operação) — finaliza Gilberto Braga.


Simulações

Para se ter uma ideia, na compra de uma geladeira no valor de R$ 2.500 em 12 meses com juros a 4,5% ao mês o IOF que incidiria antes seria de R$ 84,33, mas agora vai passar para R$ 111,52. Desta forma, o consumidor que antes pagaria 12 parcelas mensais de R$ 283,41, chegando ao valor final de R$ 3.400,92, agora vai pagar 12 parcelas mensais de R$ 286,40 totalizando o valor de R$ 3.436,80.

No empréstimo pessoal no valor de R$ 5.000 em 12 meses com uma taxa de juros de 4,5% ao mês, o consumidor desembolsaria R$ 168,65 de IOF, mas agora terá que pagar R$ 223,04.

— Assim sendo antes ele pagaria 12 parcelas mensais de R$ 566,83 (totalizando R$ 6.801,96) e agora vai pagar 12 parcelas mensais de R$ 572,79, totalizando R$ 6.873,48 — exemplifica o Miguel Ribeiro.

Os clientes de bancos que utilizam cheque especial também vão sentir o peso no bolso: o IOF sobre o uso do cheque especial no valor de R$ 3.000 por 20 dias com taxa de juros de 8% ao mês, por exemplo, vai subir de R$ 16,32 para R$ 18,11.

— O cliente que antes pagava no período um total (juros + IOF) de R$ 160,87 e agora vai pagar um total (juros + IOF) de R$ 160,97 — explica o executivo da Anefac.


Empresas

É importante destacar que esse aumento também vai impactar negativamente o crédito das empresas. A alíquota diária do IOF subirá de 0,0041% (o equivalente a uma taxa anual de 1,5%) para 0,00559% (2,04% no ano).

Por exemplo, um capital de giro no valor de R$ 50.000 com uma taxa de juros de 1,50% ao mês a ser liquidado em 12 parcelas mensais, o empresário pagaria 12 parcelas mensais de R$ 4.652,76. Quitando o financiamento com R$ 55.833,12.

— Já com o novo imposto (2,04% ao ano) ele pagará 12 parcelas mensais de R$ 4.677,51 e no final do contrato terá desembolsado R$ 56.130,12 — informa Miguel Ribeiro.


Endividamento das famílias tende a aumentar

O aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) pode dificultar ainda mais a vida de quem está engrossando o time dos endividados no Brasil. Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) aponta que 72,9% das famílias brasileiras estavam com dívidas em atraso em agosto, um novo recorde mensal.

A pesquisa aponta ainda que, além do número de famílias endividadas, também está aumentando o percentual de famílias com mais de 50% da renda mensal comprometida com suas dívidas. Essa proporção chegou a 21,1% do total de famílias endividadas em agosto.

Conforme o levantamento, cerca de 11.890 mil famílias chegaram a agosto com algum tipo de dívida, entre as principais modalidades de dívidas estão: cartão de crédito, cheque especial, crédito consignado, crédito pessoal, carnês, financiamentos de casa e carro. No mesmo momento de 2020, aproximadamente 10.960 mil famílias tinham compromissos financeiros em andamento.

As famílias com até 10 salários mínimos de renda mensal, grupo considerado de menor renda, passaram a demandar crédito e se endividar de forma mais acirrada a partir de maio deste ano. Isso ocorre mesmo com o valor médio do auxílio emergencial (R$ 300), pago desde abril aos informais e mais vulneráveis.

Os pesquisadores avaliam que o endividamento recorde para o grupo de menor renda está associado ao mercado de trabalho formal e informal fragilizado pela crise e a inflação mais elevada, que reduz o poder de compra e acirra as despesas nos orçamentos domésticos.

Para a economista responsável pela pesquisa, Izis Ferreira, mesmo que a inadimplência permaneça estável, a elevação dos juros aumenta o risco do indicador piorar no futuro.

– O crédito mais caro e as despesas elevadas restringem a capacidade de consumo das famílias. Enquanto faltarem sinais mais robustos de recuperação no mercado de trabalho formal e na renda, com alívio da inflação, as necessidades de recomposição dos rendimentos pelos mais vulneráveis seguirão elevadas. Com isso, o endividamento no país pode aumentar ainda mais – diz a especialista, em análise divulgada pela CNC.

Vale destacar que a metodologia da Peic considera “família” o grupo de pessoas que vive na mesma casa. Além disso, é uma pesquisa que busca identificar a percepção individual quanto ao nível de comprometimento com dívidas e a percepção em relação à capacidade de pagamento.