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O Dia (20/03/2021)

A pandemia e a chave do cofre

Contra a postura do ministério, pesa a omissão na discussão das vacinas em 2020, quando criou-se um falso dilema de que o isolamento social era prejudicial para a Economia

Não dá para ignorar a importância do ministro Paulo Guedes no governo. O discípulo da Escola de Chicago é um profissional de prestígio e sucesso empresarial, foi um dos fundadores do Banco Pactual, presidente de instituições de ensino e gestor de fundos da área de educação. Pressupõe-se que está no governo pela convicção de contribuir para o sucesso da gestão pública, não sendo político profissional, nem precisando servir-se do Estado para projetos eleitorais ou patrimoniais.

Passado um ano de pandemia, Guedes continua sendo crucial para manter o governo nos trilhos, mesmo combatido e tendo as suas propostas desfiguradas pelo Congresso e até pelo presidente. Ainda mantém um saldo de credibilidade junto à comunidade financeira internacional e empresarial nativa.

Contra a postura do Ministério da Economia, pesa a omissão na discussão das vacinas em 2020, quando criou-se um falso dilema de que o isolamento social era prejudicial para a Economia. Guedes se manteve estrategicamente em silêncio para não se contrapor a pregação negacionista presidencial.

Apostaram que a pandemia seria rápida, não foi. A conta da ajuda emergencial ficou cara de pagar, desequilibrando a despesa pública. Somente agora, tardiamente, com o recrudescimento do contágio, com o fim distribuição da ajuda emergencial e com a queda na aprovação do governo nas pesquisas de opinião, admitiu-se que a melhor medida econômica a se adotar é a vacinação em massa.

A recuperação econômica anda a passos lentos e de mãos dadas com a insuficiência de vacinas. Demoramos a reconhecer que o diagnóstico foi errado em 2020, porque politicamente era ruim para a imagem governamental. Agora a solução é demorada, porque o erro no momento da compra dos imunizantes ocasionará que a Economia não se desenvolva o suficiente em 2021. Mesmo com todos os esforços, a cobertura da vacinação na população só permitirá um alívio nas atividades sociais e, por conseguinte, na Economia, em meados de 2022.

A ajuda financeira deverá voltar a ser paga em abril de 2021, em valores menores após a aprovação da PEC Emergencial, que não será computada no teto de gastos. Uma vitória de Guedes, que deve manter o consumo aquecido e a recuperação parcial dos índices de Bolsonaro nas pesquisas de avaliação da sua gestão.

A inflação está subindo, forçando o Copom a elevar os juros para combatê-la. O PIB deve crescer moderadamente em 2021, mas sendo insuficiente para gerar muitos empregos. Pelo menos até agosto, o índice de desemprego não deve crescer por conta da obrigação de manutenção do emprego pelas empresas, que recorreram em 2020 às medidas de redução e suspensão da jornada de trabalho. Outra vitória de Guedes.

Por tudo isso, Guedes ainda é o fiel da balança do Governo Bolsonaro. O desempenho da Economia depende do fortalecimento do ministro e da delicada manutenção da austeridade fiscal. Considerando que a corrida presidencial já começou com a volta do ex-presidente Lula ao páreo, a pressão por gastos e emendas parlamentares deve se intensificar. Mais uma razão para se ter uma pessoa como Guedes com a chave do cofre nas mãos.